Isabel Arruda
A vida é curta

Sábado de sol. Ignorar o chamado da rua seria uma grande tragédia.
Sabe como é, carioca que mora em cidade onde o verão tem duração de algumas semanas apenas, não pode negligenciar uma oportunidade de vestir o biquini.
Aqui, a água salgada foi substituída pela doce.
Pelo menos a areia continua ali, não tão fofa ou tão quente, mas o pé no chão traz uma sensação familiar que conforta.
A água é gelada, e a alma segue quente.
O bebê explora. A mais velha reclama.
Queria estar com os amigos, ela diz.
Eu observo e penso como a vida é rara.
E curta.
Como a vida é curta pra ignorar o chamado.
Chamado de novas experiências, novas habilidades ou velhos talentos.
Pra viver adormecido. Pra viver no automático. Pra viver seguindo a manada.
Penso como a vida é curta pra viver os dias sem intenção, sem brilho ou sem paixão.
Pra viver no modo sobrevivência. Perambulando por aí.
Pra ser marionete no teatro alheio.
Penso como a vida é curta para maratonar o Netflix e viver do conforto do sofá.
Sim, o sofá é um lugar super confortável, mas não é ali que a mágica da vida acontece.
Pra viver de crônicas lidas em livros e não escrever as suas próprias.
Penso como a vida é curta pra não abrir aquele vinho caro (alô pai, essa é pra você), pra não terminar aquele relacionamento falido ou não se sentir bem dentro da própria pele.
Pra ser feliz um dia. E não hoje.
Penso como a vida é curta para viver apegado.
Pra não mudar de opinião. De emprego. De cidade.
Pra passar a vida sendo sombra.
Penso como a vida é curta para achar que você não importa.
Ou que a vida do outro é mais interessante, que os filhos são mais inteligentes e a vida mais colorida.
Pra se silenciar. Pra não se valorizar.
Penso como a vida é curta para não se apaixonar perdidamente por si.
Ah, como a vida é curta. E rara.
Ignorar o chamado seria uma grande tragédia.🌷